Hoje faz anos que te foste. Aniversarias. Comemoro? Certas datas não se comemoram, por mais marcantes que sejam, ou surpreendentes, ou inebriantes. Não me acostumei ainda ao silêncio da tua cadeira de balanço. Lembras como balançavas, e rangias, e fazias tremer o assoalho? É difícil se acostumar a certas ausências. Pensava que durarias para sempre, mas ensinaste que nada é para sempre. Ensinaste da maneira mais dolorosa.
Lembras-te das nossas brincadeiras? Eras criança em teu corpo de vovó. Eras a criança mais travessa dentre todos nós. Mas os adultos confiavam em ti, confiavam-nos a ti. Mal sabiam que rolavas conosco pelo chão, empanturrava-nos de doces e inundavas a casa em guerras d’água. Quando voltavam, tu inventavas histórias para tranquilizar os adultos! Éramos todos anjinhos.
És hoje o meu anjinho. Não sei, para falar a verdade, quando é o aniversário da tua partida. Sem tua presença, os dias se confundem. E eu, sem ter uma criança-adulta com quem brincar, acabei crescendo. Virei um adulto procurando em mim a criança que foste. Brinco em tua homenagem, faço traquinagens à semelhança de ti. Lembranças? Esforço-me para não esquecer, e de repente te ouço no rangido do assoalho quando atravesso a noite. Buscando me encontrar, reencontro-te.
Eduardo Trindade
6 comentários:
edu, fiquei com um nó na garganta e olhos inundados pelas imagens que descreves...
que lindo esse texto de saudade e saudação
beijo
Parabéns, é lindo seu texto, a nostalgia faz parte de quem ama.
marcio_doli@hotmail.com
Nossa, que magnífico, juro!
Já escrevi um texto para a minha vovó que se foi também e sempre dá vontade de escrever mais... Posso acrescentar o seu texto ao meu post? Coloco os devidos créditos :-)
O nome dele é 'Quando o anjo partiu'
"(...)Só no mundo do nunca
existem lápides...que importa se
depois de tudo - tenha "ela" partido,
casado, sumido, esquecido,
enganado, ou que quer que te haja
feito, em suma? Tiveste uma parte da
sua vida que foi só tua e, esta, ela
jamais a poderá passar de ti para ninguém.
Há bens inalienáveis, há certos momentos que,
ao contrário do que pensas,
fazem parte da tua vida presente
e não do teu passado. E abrem-se no teu
sorriso mesmo quando, deslembrado deles,
estiveres sorrindo a outras coisas(...)"Mario Quintana, Uma alegria para sempre.
É tudo uma continuidade de reticências, que as vezes te fazem imaginar o que há além, outras vezes que algo mais aconteceu e para ti queres guardar...
É que me caiu água dos olhos, vou limpar depois eu volto.
Como te compreendo, Eduardo! A minha avó não tinha cadeira de baloiço, mas tinha um sorriso como ninguém. Ainda ouço a sua voz. Chamava-se Vitória e é também o meu anjinho.
Abraço imenso.
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